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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Verdade no Asfalto

Eu quero um suicida que se mate e que se explique.
Não quero os covardes que se matam sem razão;
Quero saber se morreu de amor, de decepção ou xilique.
Mas não se sofreu antes e fez da vida arrastão
Para arrumar uma desculpa e dizer que ''viver não!''

Quero uma meretriz altiva e elegante,
Daquelas que humilham as mulheres ricas;
Fazendo com que sintam que não existia nada antes.
Quero a puta orgulhosa de si, mesmo que atenda pelo nome de Chica.

Quero um mendigo que peça sem vergonha
Que implore sem fingir, sem compaixão
Que deseje o dinheiro do burguês, do típico ''sem-vergonha''
Que deseja a mulher do amigo em seu colchão.

Enfim, quem é impuro? Quem é mau? Quem é pior?
O suicida que, por ele, tem razão?
A meretriz que vende seu calor?
Ou o mendigo que, sujo e verdadeiro, dorme no chão?

Matemos todos, finjamos não existir problema!
Mas, que fique claro, bem claro,
Que eles só são eles no poema
Por que nós os inventamos nessa vida,
E os obrigamos a viver nesse mundo seco e amaro.

H.Reis

Momento Manuel


Desencanto

Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

- Eu faço versos como quem morre.

Manuel Bandeira

domingo, 19 de dezembro de 2010

Onde tudo começa

Tinha um caminho no meio da pedra.
Caminho arriscado, traçado, marcado.
E assim, quanto mais rochas se empedrava,
Mais um caminho no fim se formava-
-A Persistência.

Até que os caminhos juntos formaram um só.
E como um coração que procura a metade
E acaba por achar e se completar,
Os caminhos chegaram numa estrada.
-A Esperança.

Estrada grande, estrada finita.
Até que encontrasse alguém para infinitá-la
E num segundo está aqui o descobridor -
O Mundo!

Olhe no olho do companheiro frio,
do companheiro inglês que não encara,
E encontrarás uma pedra, um começo de caminho-
A Vida!

H.Reis

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Prosa e poesia

Prosa não consigo mais.
É como um pássaro que acena,
E vai embora,
Deixando saudades imensas.

Deixou um filhote,
Um filhote que sabe voar,
Mas não lembra.
Um filhote estático no galho.

O pequeno olha ao redor.
Vê seus irmãos alçarem vôos.
Dos mais lindos aos fracassados
Mas são vôos, são prosas.

Agora sei que prosa não é vôo
É contemplação, é assovio.
Meu pequeno voa por dentro,
Na mais linda poesia.

H.Reis

domingo, 28 de novembro de 2010

Com licença*, José Paulo Paes e Vinícius Reis

A Casa

Vendam logo esta casa , pois está cheia de espíritos maus.

Na cozinha, há uma feiticeira que faz poções venenosas.
Na copa, uma criança segura um prato fundo sempre a esperar um mingau.
Na biblioteca, um avô lê seus poemas feitos na adolescência.
Na sala de estar, uma louca adotada aperta incessantemente as teclas pretas do piano.
No quarto azul, um bebê chora mágoas das vidas passadas.
No quarto cor-de-rosa, a avó relê o caderno de receitas que nunca usou.
Na sala de visitas, o jardineiro lembra triste das flores que morreram ontem.
No porão, a mãe chora pelo amante que morreu na 1ª Guerra.
Na varanda, uma pomba jaz.

A pomba era da criança que está na copa. Seu estômago ronca mas não dorme. Fica acordado à espera do mingau.
Vendam logo essa casa, vendam-na depressa ou despeçam a feiticeira, senão a criança jazerá. Jazerá como a pomba, que morreu de fome, fome de bondade, fome de paz, fome de vida.


H.Reis

*licença poética

sábado, 27 de novembro de 2010

A culpa é do Tempo

Num segundo acontece tudo que a História reprimia.
Num segundo toda a humanidade esquece príncipes,
Num segundo Napoleões não existem mais,
Num segundo Ana Bolena vive como Catarina.

Num segundo Hitler esquece judeus,
esquece sudetos, câmaras,
esquece canhões, tiros e inconvêniências,
esquece de matar.

Num outro segundo bem próximo,
Stalin joga um carteado com Lênin;
Fidel solta as rédeas da linda Cuba,
cubanos livres!

Numa junção de segundos suspensos,
Africanos se esbaldam em banquetes naturais;
Coreanos são todos amigos, sem distinção;
Europeus deixam de ser belicistas;
Americanos esquecem metrópoles.

Mas , o problema é que,
Essa ''junção de segundos suspensos''
pode vir a ser um minuto.
Um minuto é muito tempo
Pr'um humano pensar só em delícias.

Um minuto corrompe o homem;
Vê a vida feita de segundos?
Não, pois existe o relógio;
O relógio que marca um minuto.

Um minuto já faz a História;
Já faz a má História;
A sangrenta História;
A nossa História.

H.Reis

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Morre-se uma vida

Antes que o dia arrebente,
Antes que o frio se esquente,
Antes que o cérebro deixe a mente,
Antes que o filho nasça secamente.

Antes que as guerras fiquem na memória,
Antes que a paz deixe a História,
Antes que os maus mereçam a vitória,
Antes que não exista mais nenhuma trajetória.

Antes que a morte vire forma de vida,
Antes que a pele vire comida,
Antes que a terra seja banida,
Antes a verdade se torne falecida.

Antes de tudo e,
Num estalo de dedos,
Num piscar de olhos,
Num beijo de amantes
A vida se transformará,

A vida enlouquecerá,
A vida esquecerá,
A vida abandonará sua condição de vida
E torna-se-á humana.

H.Reis

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

#2

Num tempo em que buscar mais é buscar menos, num tempo em que doar-se não significa nada, eu amo. Eu amo os feios, eu amo os órfãos, eu amo os brutos; eu amo quem não sabe que é amado, mas quem sabe que precisa e que vale a pena viver nesse tempo, nesse tempo feio, bruto e sem pai nem mãe.

H.Reis

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Criança é fogo

Cotinha e a nova vizinha

Em nossa casa tinha um galinheiro enorme que até patos e marrecos se misturavam com a galinhada. Eduardo adorava aquela barulheira, acordava com o cocoricó de manhã e logo ia lá dar milho às aves custosas. Eram muitas as aves, mas Edu, particularmente, gostava mais de uma: Cotinha.

Cotinha era uma galinha d'angola arisca, que vivia correndo e fazendo bagunça pelo terreiro. Edu gostava dela, tenho certeza, exatamente por esse jeito dela que correspondia ao dele, menino arteiro. As pintinhas brancas espalhadas pelas penas pretas o divertia. Várias vezes o peguei, agachado no chão de terra do terreiro,contando as pintinhas da querida pintadinha, mas ele desistia logo depois. Sua inquietude e hiperatividade não o deixavam chegar nem em 15 pontos brancos.

Mudou-se então, nesse tempo, para perto de nossa casa uma vizinha nova; uma moça que havia vindo do Mato Grosso e não tinha parentes por perto.Um detalhe: tinha vitiligo por todo o corpo. Edu e eu, num dia, enquanto voltávamos da escolinha para casa, avistamos a tal nova vizinha sentada no passeio rente ao seu portão. Cumprimentamo-nos, e eu, como sempre quero conhecer quem mora perto de mim, fui tentar puxar assunto e disse:

- Olá, vi que você se mudou pra cá faz pouco tempo. Como é seu nome?

- É, hoje faz uma semana que cheguei aqui. Meu nome é Conceição, mas pode me chamar de Cotinha, todo mundo me chamava assim lá em Campo Grande; sinto-me mais à vontade se me chamar assim.

Eu ia responder á moça, quando Edu, que se encontrava distraído, olhando os passarinhos e os desenhos que as nuvens formavam no céu, quando ouviu o nome familiar, virou-se logo para a nova mulher e disse, cheio de entusiasmo e novidade:

- Cotinha? Nossa, que legal, moça. Minha galinha também chama Cotinha. Vamo lá em casa procê ver ela! Sabia que cê até parece com ela um pouquinho? Essas marquinhas brancas aqui.

Criança é fogo!

H.Reis

Bye, Lets

Queridos seguidores, venho aqui para dar um aviso um pouco triste:
Nossa companheira Lets saiu do GDL. Sim, ela não faz parte mais dos bastidores desse nosso mundo verde e azedo/doce no qual eu escrevo sempre.
Lets continua minha amiga, continua escrevendo e surpreendendo a todos com seu talento que ela insiste em dizer que não existe.
Assim como toda pessoa que vai, vai para algum lugar, Lets também foi, foi para o Livros e Chaves, seu blog novo que promete bastante.
Aqui está o link, entrem lá e aproveitem: http://livrosechave.blogspot.com/

H.Reis

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Casa amarela, menina cega

Numa casa amarela bem velha daquela rua de pedra morava uma menina cega. Todos tinham dó da menina por ela ser cega, por ela não poder ver o mundo, as cores e a natureza delicada de sua cidadezinha.

A menina não sofria por não ver. Ela era satisfeita por poder sentir delícias comestíveis, delícias ouvíveis, tocáveis e olfativas. A menina, na realidade, não via mesmo, mas enxergava. Enxergava mais que muitas pessoas com olhos que viam muito bem. Enxergava o bem e o mal. Enxergava a vida em si, e para isso - muitos de nossos contemporâneos ainda hoje não perceberam tal detalhe - e para isso não se necessita olhos, boca, nariz ou ouvidos. Necessita-se apenas uma alma que saiba amar de verdade.

H.Reis

Lágrimas na estação

No último dia do adeus, da vida, da morte e da borboleta invisível ao meu coração, ele partiu.
Voou ao longe, alçou um voo altíssimo e me deixou;
com a borboleta e o coração na mão.
Os olhos ainda estavam no lugar, mas o trem já tinha comido metade do trilho ferrenho, ferroso, de ferro.

H.Reis

sábado, 6 de novembro de 2010

Morenice aguda

A Morena que te olha, a Morena que não te vê.

Que é tu pra achar que a Morena olharia pra você?

A Morena olha pro invisível, a Morena olha pro céu.

E o queixo dela fica a aparecer.

Ela prefere te mostrar o pescoço moreno

Do que te encantar com olhos de cigana.

Nada oblíqua, nada dissimulada.

Somente linda e delicada.

H.Reis

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Andança

Acompanho Drummond,
que me leva a ruas de Itabira,
A ''Aniversário'' e a ''Tardes de Maio'' perdidas.
Enquanto andamos reparo em sua calva cabeça.
Cabeça de muitas ideias,
Cabeça de muitas vidas,
Cabeça de um só Drummond.
Nunca calva de ideias ou palavras.

''O Vestido'' que traz nas mãos é mesmo seu.
Não lhe serve,
Não me serve,
Serve a quem?
Ao poeta invisível que perdoa a traição,
Que se perde no amor imenso.

Drummond correu,
Dobrou a esquina da rua estreita.
Nunca mais o vi.
Itabira perdeu seu artista.
''O Vestido'' ficou em minhas mãos.
Só agora ele me serve.

H.Reis

domingo, 31 de outubro de 2010

#

Qué es el miedo? El miedo soy yo sin consciencia o duda. O sea, el miedo soy yo sin yo.

H.Reis

terça-feira, 26 de outubro de 2010

F de Consolação

Chico, Clarice, Caetano
Todos eles começam com C
Helena, com um simples mortal H
Um H que é ponte,
Que é vínculo,
Mas não tem som, fonema ou fama.

O que me consola um pouco é que Chico se chama Francisco.

H.Reis

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Segredo Escarlate [parte 1]

Da porta de vidro da entrada eu a via. Lá estava ela, deslumbrante como sempre, bem no centro da sala redonda com lustres antigos.
Seu vestido vermelho de alta costura combinava perfeitamente com seu caráter: provocante, mas delineado e preciso.

Do primeiro passo da porta não conseguia ver nitidamente seu rosto, mas sabia que não me decepcionaria. Chegando mais perto, com meus passos leves- pois temia que o encanto se fosse em um piscar de olhos - pude ir percebendo mais claramente a perfeição de sua tez branca e pura. Ela não havia corrompido seu rosto com uma maquiagem pesada. Só usava um batom também cor de sangue como o vestido. O intervalo entre o vestido e a boca era perfeito para que o vermelho não ficasse excessivo ou exagerado.

- Querido, como está elegante! Você realmente superou minhas expectativas!, ela falou com aquela voz delicada e fina e deu uma risada gostosa jogando a cabeça para trás.

- São seus olhos, meu amor. Se tem alguém aqui que está deslumbrante é você!, falei isso pegando sua mão direita e a fazendo girar no centro da sala redonda com lustres antigos.

- Oh-oh! Eu não disse que você está deslumbrante, disse que está elegante. É diferente; ela disse com um rosto sério, depois a face semblanteou ironia e ela riu de novo. Não se assuste, meu bem, estou mesmo um pouco fora de mim. Bebi um drink enquanto você não chegava.

- Ah, sim. Tudo bem, prefiro mesmo você assim, mais livre e divertida. Quando não bebe, você chega a ficar séria demais.

Ela não parece ter dado a mínima importância ao meu comentário e disse:

- Vamos ao jardim? James nos servirá algo gelado enquanto contemplamos o outro e as flores lá de fora.

- Claro.

O caminho da casa até o jardim era curto e ela ia na minha frente. Não ia fazer sala pra mim ou me fazer sentir uma visita, eu já previa.

Chegando ao jardim, avistei logo a mesa e as cadeiras de ferro pintadas de branco. Aquele cenário já fôra palco de muitas conversas e risadas. Sentamo-nos e esperamos James chagar com o ''algo gelado''. Enquanto esperávamos, Beatrice acendeu um cigarro e me ofereceu.

- Quer, querido? Você está precisando soltar umas baforadas de fumaça pra tirar esse peso da sua alma. Se não se descarregar, não vai aguentar por muito tempo. Vamos, pegue um.

Não ia retrucá-la. Não valia a pena. Os argumentos dela eram sempre mais fortes. Peguei o cigarro, acendi, mas não fumaria, deixaria ele se queimar por inteiro até que acabasse.
James chegou com os drinks na bandeja de prata que reluzia.

- Beatrice, pensei que era um chá gelado! Você sabe que eu não bebo, não fumo, não tenho vícios! James, por favor, leve de volta esse àlcool e me traga um chá, nem que seja de carqueja.

Beatrice riu mas não reagiu negativamente. Esperou James desaparecer e disse bem devagar e num tom desafiador:

- Não bebe, não fuma, não tem vícios, mas tem um segredo. E eu sei qual é. Desde o dia que me contou, Harry, tenho uma visão um pouco perversa de você. Nunca mais será o mesmo pra mim.
Por que fez isso, meu amor? Eu te amava um pouco mais antes.

Do drink que ela havia tomado antes de eu chegar não haviam mais resquícios, ela estava sóbria e lúcida. Falava a verdade. Eu já havia percebido seu afastamento de mim desde o dia que havia contado a ela meu segredo. Minha expressão foi ficando vermelha, sombria e enraivecida com a revelação do que antes era só uma observação minha. Eu não poderia suportar aquela indiferença, nem que fosse mínima ou reprimida.

Beatrice bebeu um gole do drink rosado. O líquido desceu pelo interior de seu pescoço fino e aquilo me chamou a atenção. Minha raiva era latente, pulsante e interminável. Sem pensar, levantei-me bruscamente da cadeira de ferro e fui com minhas mãos em direção ao pescoço de Beatrice. Ela não teve tempo de reagir.

Matei-a ali mesmo, no centro do jardim, perto do conjunto de ferro pintado de branco. Nos pés da cadeira que ela estava sentada há alguns minutos atrás, haviam gotas respingadas de sangue.

Depois de me dar conta do que havia feito, comecei a observá-la. O colo de seu seio estava molhado com o sangue fresco. Não havia mais o intervalo de pele branca entre o vestido e a boca. Tudo tinha cor escarlate. Os lábios vermelhos - que me diziam coisas loucas e ás vezes verdadeiras - estavam abertos fazendo com que o rosto demonstrasse uma expressão de consolo tardio. O corpo sem vida deitado no verde era sensual mesmo que sem pose premeditada. Beatrice nunca esteve tão linda.

Quando me levantei, cansado e aliviado, sentei-me na mesma cadeira de antes. Respirei fundo e observei a taça na qual ela havia encostado a boca minutos antes. A boca carnuda e maravilhosa. Tão presente e viva. Ela deixou a marca da boca desenhada no copo e o drink pela metade.

Foi melhor matá-la. Não suportaria ela sentindo a cada dia seu amor por mim se esvair mais. Não suportaria que ela me amasse menos que antes. Eu queria aquele amor completo e inteiro. Perfeito e intacto. Pelo menos agora ela não me amava nada e meu segredo estaria para sempre guardado e intocável em seu corpo cor de leite. Em seu corpo provocante, mas delineado e preciso assim como seu caráter que lhe custou o silêncio e a vida.

H.Reis

terça-feira, 19 de outubro de 2010

As sobremesas da vida

Pessoa mais caridosa que ela não existia. Mais meiga também não. Mais bonita se encontrava sim, mas ela não necessitava dessa beleza física, efêmera e tão visual. Era assim minha vó Amélia.
Sempre gostei mais de vovó Amélia do que vovó Dulce. A razão eu nunca soube. Acho que nossos anjos da guarda se davam melhor.

Os bolinhos de chuva feitos por ela sempre me aguardavam quentinhos em cima da mesa de madeira quando eu era criança. O avental preso nas costas dela nunca estavam impecáveis, ela sempre o molhava lavando a louça ou sujava de açúcar, aquele pra polvilhar os bolinhos. Seus abraços eram gostosos e ternos, e eu, que tinha a altura da cintura dela, quando a abraçava, fazia com que minhas bochechas encostassem no açúcar para que eu, depois, pudesse adoçar um pouco a língua.

Os almoços organizados por ela não podiam sair melhores. Era uma fartura, uma gostosura dessas que só a Sua Vó faz com que tudo dela tenha. Eu, mesmo que estivesse sentado ao lado de mamãe para almoçar, na hora da sobremesa corria pra cadeira ao lado de vovó e, enquanto comia qualquer um daqueles doces maravilhosos preparados por ela, ouvia suas histórias de quando era menina e fantasiava viver naquela época.
Meus domingos não podiam ser mais agradáveis.

Fui crescendo, vovó envelhecendo mas nunca perdendo a graça ou a ternura. Sua lucidez parecia intocável. O ritual de me sentar ao seu lado na hora da sobremesa continuou. As histórias mudaram, ela não me contava mais sobre sua infância. Contava agora sobre suas artes na adolescência e suas escolhas na fase adulta. Eu me deliciava do mesmo jeito. História de vó parece ter sempre um toque de magia. Nunca me pareceu que ela houvesse feito alguma coisa na vida da qual tivesse se arrependido ou percebido que foi mal ou errado. Ela era perfeita.

Certo dia, eu, já com 27 anos, sentado ao lado dela naquela nossa hora sagrada, a disse:

- Vovó, a senhora está sempre a me contar coisas boas que fez, que viveu. E as coisas ruins? E seus arrependimentos? Nunca praticou um ato falho?

- Meu querido, eu esperava que um dia me fizesse essa pergunta. Se não a fizesse, confesso, a julgaria um tonto. Mas te dou um conselho: ''nunca se deve praticar um ato que não possa ser narrado durante a sobremesa.''

H.Reis

sábado, 16 de outubro de 2010

O pior dos pesadelos

A vontade de fazer xixi era maior que qualquer coisa. O voo já tinha sido anunciado e sairia em torno de um minuto. Oque fazer se o banheiro era longe, as malas eram muitas e o tempo mínimo?
A solução mais simples nunca vem na cabeça de um desesperado, ele só consegue pensar no que vai dar errado.

Pensou, hesitou, olhou para o caminho do banheiro, voltou os olhos para as malas e franziu a testa em sinal de reprovação a tudo: ao suco de uva que bebeu demais em casa, ao banheiro complicado e ao seu exagero em trazer tantas roupas só para passar uma semana fora. Esse processo durou uns oito segundos, só tinha agora 52. Por um instante, que não era um, eram cinco, veio a solução mais óbvia(aquela mais simples) : usar o banheiro do avião.

- Mas é claro! Como eu não pensei nisso antes?

Pegou as malas de qualquer jeito e as saiu arrastando pelo longo caminho do aeroporto. A bolsa de ombro que levava quase caiu, o salto quase quebrou e a manga da blusa de frio tapava o relógio de pulso, mas ela não ligava, só se importava em chegar no avião, arrear a calça, sentar e fechar os olhos.

Faltando 30 segundos, segundo suas contas ( que não deveriam estar lá bem certas), ela avista a uns 25 metros uma fisionomia conhecida, daquelas que nunca se esquece (como o dono da padaria em que você, com cinco anos, comprava bala sempre que seu pai te dava 50 centavos ou a empregada legal da casa da sua amiguinha). Mas não era nenhum dos dois; seu Jaci já havia de ter morrido há muito e Jucicleide voltou para o Pará. Quando chegou mais perto viu que nunca havia visto aquela pessoa na vida. Aquilo deveria ter sido alucinação.

Entrou no avião. Nada mais poderia impedi-la de chegar ao banheiro agora. Os metros eram poucos, os centímetros ralos e o caminho livre. Deixou as malas em qualquer lugar e foi direto ao banheiro. Chegou lá como se tivesse passaporte para o paraíso, mas havia uma coisa: a fila não era pequena. Quer dizer, era, tinha duas pessoas, mas para quem está apertadíssimo, não existir ninguém no mundo que ameace a chance de ser fazer O xixi, é a melhor opção.
Só para piorar a situação, alguém, vindo de trás, tropeça e acaba por cair em cima de nossa protagonista, que depois disso não aguentou e soltou a bexiga, ali, no chão do avião mesmo.

Aquela posição de estar deitada, aquele molhadinho no pano, e aquela sensação de não saber onde está, fazia ela lembrar uma coisa bem familiar: xixi na cama.
É, o sono acabou, mas o aperto também.

H.Reis


quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Continue precisando

Um dia você não vai mais precisar chorar; não vai mais precisar fingir gostar de quem não gosta; não vai mais precisar dar bom dia ao caixa da padaria; não vai mais precisar parecer achar graça no idiota; não vai mais precisar obedecer ao seu superior; não vai mais precisar renunciar das suas coisas por causa de alguém; não vai mais precisar ouvir aquele seu amigo que insiste em reclamar da vida; não vai mais precisar dar conselhos a quem necessita; não vai mais precisar dormir pensando se seu filho está bem na rua; não vai mais colocar o lixo pra fora ou ouvir a buzina atrás de você no trânsito caótico; nem mais ver a inveja do infeliz; mas quando você não precisar mais de fazer tudo isso, você estará morto, pode ter certeza.

H.Reis

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Pequena (in)constante

Cruz e Sousa gostava de névoa;
Baudelaire, de prostitutas e mendigos;
Machado gostava de Helena;
Helena gosta de você.

Sabino gostava de Belo Horizonte;
Clarice, nem sei se da Ucrânia;
Páris gostava de Tróia de Helena;
Helena gosta de você.

Elis gostava de grito;
Caetano gostava de fantasias;
Chico gostava Pedro pedreiro;
Helena continua gostando de você.

H.Reis

domingo, 3 de outubro de 2010

Criança é fogo

Presente grego

Eduardo brincava na varanda com os primos que haviam acabado de chegar. Nós, os pais do pestinha, estávamos fazendo sala para minha cunhada e o marido e com os mesmos assuntos de sempre. Chatos e enfadonhos por sinal.

Minha cunhada, porém, veio com um assunto novo que me surpreendeu:

-Helena, esse quadro que demos a vocês de casamento mudou de lugar por que? Lembro-me que da última vez que estivemos aqui ele estava na parede azul da copa, perto da mesa.

-Ah, eu gaguejava tentando arrumar uma explicação, Eduardo, que... que rabiscou esta parede aqui, então colocamos o quadro em cima justamente para tapar o desenho.

-Ah, mas então temos que dar a vocês outro quadro para colocarem lá na parede azul da copa, por que sinceramente, falta uma decoração ali e esse quadro ficava mesmo melhor lá. Vou conversar com a mesma pintora que fez este aqui e ela fará outro, ainda mais bonito , para colocarem na copa, tá bom?

- Não, não precisa Juliana, por favor, fico até com vergonha.

-Ah, mas ia ficar tão bonito... Não diga não,é presente e pronto.

Fiz uma cara de falsa agradecida e olhei pra meu marido ,que, com o olhar, dizia pra eu não falar mais nada e aceitar logo o presente antes que sua irmã começasse a discutir, e nós sabíamos bem que ela era escandalosa.

As crianças enfim cansaram de brincar e vieram para dentro, estavam cansadas e ofegantes de correr e então Eduardo levou todo mundo pra tomar suco. Depois do suco tomado, coloquei Eduardo no meu colo e dei um beijo, precisava aproveitar a época em que ele ainda cabia no meu colo e que ainda não reclamava dos meus beijos em público,afinal, já estava com seis anos. Enquanto estava sentado ali em meus joelhos e mexia no meu cabelo, ele virou para trás, deu uma olhada desconfiada na parede, cerrou as sobrancelhas, voltou-se para mim e perguntou:

-Mamãe, por que toda vez que a tia Juliana vem aqui em casa você coloca esse quadro na parede?

Criança é fogo

H.Reis

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Risada imersa

Eu rio
Tu ris
Ele ri
Nós rimos
Vós rides
Eles riem

Ainda bem que eu tenho um rio só pra mim.
É por isso que eu rio. Pense só, se eu não risse o rio não existiria e triste eu ficaria.
Sem rio, sem riso.

H.Reis

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Graçamor.

Maçã mordida com furor;
com graça;
com amor.

Limão espremido com fervor;
com graça;
com amor.

Texto lido com terror;
com graça;
com amor.

Amo-te sem pavor;
sem graça;
mas com amor.

(Para uma pessoa, só o amor basta. Pois graça ou pavor são consequências tristes, daquelas que vêm para maquiar o que ainda sobrou do que era bom.)

H.Reis

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Tarados também envelhecem

O velho senhor estava na biblioteca. Não, não lia. Estava sentado na enorme poltrona marrom, segurava sua bengala e tentava não pensar em nada.

A empregada entrou, olhou o velho com a máxima indiferença e começou a espanar os livros antigos da preteleira mais baixa da estante. O uniforme era um vestidinho curto e azul, bonito até.
Quando ela se abaixou para espanar, o velho fez questão de prestar atenção. As nádegas simétricas dela eram as mais bonitas já vistas por aqueles olhos cansados e tarados do senhor. Ele se ajeitou ainda mais na poltrona para obsevar aquilo de camarote. Os seios não tão grandes davam a ideia de delicadeza de busto, coisa bonita em meninas novas.

Ele, lá mesmo da poltrona perguntou:

- Tem namorado, menina?

A empregadinha estranhou. Aquele velho nunca havia dirigido a palavra a ela e agora vem perguntar se ela namorava? Ela hesitou em responder, mas não viu maldade.

- Tenho noivo, por que?

- Ele tem sorte. Pode aproveitar sozinho esse seu bumbum tão bonito!

Ela quase se ofendeu, mas achou bobagem. Aquele velho deveria ser esclerosado ou coisa assim. E também, mesmo ele sendo tarado, que mal poderia fazer a ela? Ele mal conseguia levantar da cama sem ajuda. Então deu corda:

- Pois é, ele nasceu virado com a bunda pra lua; ela deu uma risadinha escondida, se divertindo com o trocadilho mal feito.

O velho se assustou e não disse mais nada. Só resmungou para si mesmo:

- Meu Deus, que menina desbocada. Não se fazem mais empregadas como antigamente.

Ela, com um risinho no canto da boca, terminou seu serviço e saiu muda da biblioteca.

Ele, vendo-se sozinho, disse sem resmungar:

- O noivo dela nasceu com a bunda virada pra lua e ela bem que poderia ter nascido com a bunda virada pra minha janela!

H.Reis

domingo, 12 de setembro de 2010

Momento Kerouac


''Eu só confio nas pessoas loucas, aquelas que são loucas pra viver, loucas para falar, loucas para serem salvas, desejosas de tudo ao mesmo tempo, que nunca bocejam ou dizem uma coisa corriqueira, mas queimam, queimam, queimam, como fabulosas velas amarelas romanas explodindo como aranhas através das estrelas.''

Jack Kerouac (postado por H.Reis)

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Criança é fogo

Alguns dinheiros e a moça legal

Edu já havia completado os seis anos e vivia me pedindo dinheiro. Queria comprar alguma coisa sozinho. Orgulho de criança, coisas de criança daquela idade. Então, eu, mãe coruja e que ás vezes faz os caprichos da cria, dei cinco reais a ele. Deixei ele mesmo decidir oque faria com o dinheiro.

Passaram-se dois dias e nada de Edu falar oque comprou com aquela nota. Eu havia ido buscá-lo na escola de carro e ele, no meio do caminho avistou uma padaria e pediu para que eu parasse em frente antes de seguirmos pra casa. Perguntei oque ele queria lá e ele respondeu:
-Ah, mamãe, a senhora me deu dinheiro outro dia e hoje eu tô doido pra comprar alguma coisa com ele.

Adorei a ideia, estava louca pra saber com oque Edu gastaria aquilo; seria uma cena inédita pra mim. Paramos à porta da padaria, resolvi nem sair do carro, deixaria ele entrar, escolher oque quisesse comprar e pagar sozinho; um pouquinho de falsa independência seria bom pra ele, faria ele se sentir mais ''homenzinho''.
Ele demorou um pouquinho a voltar, mas entrou no carro radiante. Estava com um saquinho cheio de guloseimas, mas aquela felicidade toda não poderia ter sido causada só pelos doces. A outra maõzinha estava cheia de moedas, deveria ser o troco da compra. Admirei-o por não ter gastado todo o dinheiro que tinha.
Perguntei por que sorria daquele jeito e ele me respondeu prontamente:

-Mamãe, aquela moça lá da padaria é muito legal!
-Por que meu filho, oque ela fez?
-Por que você dá ''um dinheiro'' pra ela e ela te devolve um tanto de ''dinheiros'' !!!

Criança é fogo

H.Reis

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Minas Gerais


A contar um causo, a tricotar com a vizinha,a colocar uma broa de fubá para assar( e deixá-la corar como o marrom da cor da terra), a falar uns ''uai'' por aí, a assar um pão de queijo, a passar um café em filtro de pano, a sentar no passeio às cinco horas da tarde e observar as crianças arteiras; assim vivem as senhoras mineiras, a fazer essas coisas.
Vivem no interior, onde é longe da cidade, onde o boi pasta tranquilo e o barulho da carroça avisa que o marido chegou.
A cidade é coisa rara, é luminada e lá vivem gentes cheias dos ''não-me-toques''.
Mas as senhoras mineiras, as que ainda nos restaram, estão felizes em suas cidadezinhas pequenas, em suas cidadezinhas quaisquer.
As goiabas mais gostosas dão no quintal, não se precisa comprar.
Os postes com lâmpadas não são muitos; lá as pessoas preferem a lua como fonte de luz principal quando a noite chega.
As janelas abrem logo cedo, mas devagar, que é pra ser fiel à poesia de Drummond.
Mas não sejamos tão fiéis ao nosso mestre.
Ele sabe que essa vida não é nada '' besta, meu Deus!''.
Ele sabe que essa é a melhor vida que se pode ter.

H.Reis

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Ilusão Agridoce (Antítese)

Vejo-te pela janela do meu castelo.
Você vem em um cavalo branco;
Os pássaros cantam;
Borboletas aparecem no ar
E também em meu estômago.
Meu vestido é lindo.
E feliz estou a te ver chegar.

Você se aproxima,
E sem dizer nada toca seus lábios nos meus
Como se eu fosse uma boneca de porcelana.

Você me faz feliz.
Nós nos fazemos felizes!

Mas a hora da estrela
E também da tristeza chega logo.
Pela janela do meu casebre comum
Vejo você indo embora.
Seu cavalo negro trota tristemente;
As cigarras fazem ruídos irritantes;
Urubus aparecem no ar,
Então meu estômago se embrulha.
Vestida com meus velhos trapos
Estou triste ao te ver partir.

H.Reis

Selos e mais selos


Gente, nosso blog recebeu uns selinhos muito carinhosos e como sempre da Gabi Morgante, dona do Mundo Platônico .
Vamos lá ver oque nos espera.


Alguns desses selinhos pedem para que eu indique outros blogs, ok.


Não vou novamente falar aqui mais nove coisas sobre mim. Vocês já devem ter enjoado de saber da minha vida. E vai ficar muito repetitivo, ok? Rs.
Gabi, muito obrigada pelo carinho e consideração.
Beijinhos de H.Reis pra todo mundo e pro mundo todo.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Encaixe

Roça. Repolho.
Rua. Reta.
Roça. Repórter. Respeito.
Rua. Repóter. Riso.
Reta .Ribeira. Refeição.
Ah, vamos logo nadar no Rio da Roça e dar uns Risos do Repórter da Rua Reta que comeu Repolho na Refeição!

H.Reis

domingo, 29 de agosto de 2010

Insônia que leva ao sonho

A insônia abateu sobre mim numa madrugada de sábado. Fui então abrir a janela do quarto para o vento puro e sonolento renovar o ar do cômodo marrom.
- Que vida sem graça! Que noite linda! Como sou velho!
Debrucei-me no parapeito da janela na esperança de ver algum bêbado com o relógio atrasado pelo álcool ou algum marido que fingiria ter o relógio atrasado pelo trabalho. Nenhum dos dois tipos passou. Passaram corujas atentas à procura de algo novo; mas corujas não me interessam, oque me interessa é gente, é fala, é pele, é sorriso ou lágrima.
Passaram então, para matar minha sede de gente e acentuar ainda mais minha insônia, alguns jovens alegres e fortes. Faziam barulho de sapatos distintos, de vozes distintas e de idades semelhantes. Deviam estar voltando de alguma festa, de alguma comemoração, e alguns deles traziam vestígios de estarem tontos, alcoolizados; mas nada os impedia de serem lindos, pois eram jovens, sem medo da vida ou da morte, do certo ou do errado. Alguns cantavam , outros se paqueravam , outros só observavam os protagonistas.
Uma loira de cachos rebeldes e olhos reinventados pela lua era a mais eufórica do grupo; dançava com todos, ria para tudo e fazia jorrar poesia na rua. Ela chegou a me ver, acenou. Eu retribuí o cumprimento. Ela então gritou lá de baixo:
- Vem pra cá, vem andar com agente !!!
Eu, sem dizer palavra, fiquei perplexo. Não pensei nem uma nem duas vezes, coloquei meu hobby vermelho, calcei minhas havaianas e desci escada abaixo. Eles me esperavam na mesma farra, sorrindo, cantando e dançando. A loira me pegou pelos braços e me abraçou com emoção. Eu já não entendia mais nada.Não era preciso entender; fomos chegando ao fim da rua e ao fim de minha velhice, pois agora eu fazia parte daquela juventude tão eterna e deliciosamente poética.

H.Reis

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Ave humana


Dentro de mim mora um pássaro. Um pássaro com asas e bico está dentro de meu ser. Suas penas fazem carinho e seu bico não me machuca. Seu canto é o brilho dos meus olhos quando penso no amor, quando penso que o amor pode dar certo. Quando ele se cala, minha esperança se afrouxa, deixando murcha a alma presa em minhas veias. A glândula uropigeana do pássaro corresponde ao meu coração, que ao invés da glândula (que secreta óleo para impermeabilizar as penas) produz amor, para tapar os buracos que a tristeza e a solidão deixaram em mim. Vou sobrevivendo desse amor solitário, que até hoje espera um outro pássaro para completar sua metade e fazer dela uma só.

H.Reis

Será que acabou?

Meus queridos seguidores, já devem ter percebido que não escrevo faz mais de uma semana. Isso é lastimável. Mas é o real, e sabe oque eu acho? Que o potinho que eu tinha no qual era colado o rótulo ''INSPIRAÇÃO'' acabou. É, é muito triste, mas tudo que é bom um dia acaba.
Brincadeirinha!!!! HAHAHA
Mas estou mesmo preocupada, minha inspiração fica cada vez mais escassa.
Tinha que desabafar isso aqui, em meu refúgio mais compreensivo.
Isso deve ser fase. Prometo escrever muitos e muitos mais textos para mim e para vocês, pois é isso que me mantém viva; que mantém viva minha vontade de ser melhor, cada vez mais e mais...
Um beijo dessa blogueira que adora vocês de coração,
H.Reis

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Criança é fogo

O espelho

- Mamãe, compra um espelho pra colocar no meu quarto?
-Claro meu amor, também acho que precisa. Vou falar com seu pai e agente vai comprar no sábado, pode ser?
- Aham, ele fez uma cara de contrariado; dava pra perceber que ele queria o espelho naquele dia, se possível.
A semana passou e Edu só falava do espelho. Eu percebi logo a expectativa criada na compra do obejto, fiquei um pouco preocupada mas depois me desencanei, pois, porque uma criança de 6 anos ia se preocupar tanto com um espelho? E ele me falava que não era um espelho qualquer,que era bem diferente dos que tinham lá em casa.
Chegou o tão esperado dia e fomos lá, a família feliz, comprar o espelho e mais algumas coisas que precisava.
Entrando na loja, Edu avistou um funcionário, que ele reconheceu por estar com o uniforme da loja e foi logo perguntando:
- Moço, tem espelho aqui, né? Acho que se o vendedor falasse que não, Edu teria um treco ali na hora.
- Claro que tem, quer que eu te mostre alguns modelos?
Eu estranhei aquela cena; como um vendedor oferece ''mostrar alguns modelos'' de algum produto para uma criança de 6 anos e sozinha? Fui lá acompanhar o precoce. Cumprimentei o vendedor com uma cara de reprovação e fomos ver os tais modelos de espelho. Aquela história já estava me cansando.
Chegamos no local onde ficavam as peças e o funcionário foi mostrando cada uma, Eduardo dizia que não era aquela que queria, e nem aquela ali.
Chegando na penúltima peça à mostra, eu perguntei:
-Mas, meu filho, acho que o espelho que você está querendo não existe. Já olhamos todos, de tudo quanto é jeito e não é oque você quer! Explica pra mamãe como é o espelho que você tá procurando.
Eduardo ficou calado e girou os olhos por toda a loja para ver se encontrava o que queria. Logo depois, os olhinhos negros dele deram um salto e ele disse:
- É aquele ali, mamãe! É aquele ali! Apontou para o teto e sorriu!
Eu não acreditei no que estava acontecendo.
- Mas meu filho, pelo amor de Deus, você quer um espelho para colocar no teto do seu quarto?
Eu já estava constrangida e o vendedor dava risadas abafadas daquilo tudo.
-Onde você viu um espelho desses, Eduardo?
Ele, com os olhinhos ainda saltitantes e brilhosos, disse:
-Ah, mamãe, lembra aquele dia que eu fui brincar na casa do Luiz Fernando?
- Aham!
-Então, agente foi brincar no quarto da mãmãe e do papai dele e lá tinha um espelho desses, bem encima da cama. Então eu também quero um. É legal né?
Criança é fogo!

H.Reis

domingo, 15 de agosto de 2010

Mais que luto...


Um professor, um amigo, um companheiro nosso, Cléber Viana, faleceu; e nós, Letícia e eu, estamos muito tristes e queremos manisfestar essa tristeza. Ele foi uma pessoa que fez diferença na vida de seus alunos; as aulas dele não eram aulas de espanhol ou literatura espanhola; eram aulas de vida e sensibilidade.
Cléber, nunca te olvidaremos!


H.Reis, eterna alumna suya.

sábado, 14 de agosto de 2010

Este Blog é Bipolar

Olá seguidores queridos, o Gota de Limão foi indicado pelo blog da Gabi Morgante , Mundo Platônico, para o selinho: ''Este blog é bipolar''.


Fiquei surpresa e felicíssima com a indicação. Agradeço muito à minha querida colega blogueira Gabi. Seu blog é mais que indicado aqui!
Mas não é só isso ,pessoal. Existem regrinhas. É; tenho que indicar outros blogs e ainda contar dez coisas sobre mim.
Então vamos lá, né? Depois de ter um blog indicado para uma coisa legal, contar dez curiosidades sobre você não deve ser difícil.

1- Sou noveleira. Ah, é genética. Minha avó também é.
2- Sempre rio quando estou nervosa; então, se me contar que alguém morreu e eu der um risinho, não se ofenda.
3- Tudo, tudo o que acontece à minha volta eu tenho vontade de escrever. É tudo poesia pra mim.
4- Amo café, mas nunca tomo puro, só com leite.
5- Meu brigadeiro faz sucesso.
6- Me imagino como professora de Literatura. (?)
7- Odeio estereótipos.
8- Faço amizade muito fácil.
9- Acho Napoleão Bonaparte um charme.
10- Meu filme preferido da infância é Polegarzinha.

Blogs indicados:


Adorei fazer isso, muito obrigada pela oportunidade, Gabi.
E também muito obrigada a todos os meus seguidores. Sem vocês, não tem blog.
Beijos, H.Reis.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

A velha mais confusa

Eu sou uma velha que todos pensam que não pensa. Sou ''esclerosada e psicótica''. Esquecem-me na frente da televisão por quase um dia inteiro e vão para seus afazeres. Não percebem nem sabem que vejo e analiso tudo. Reparo que falam de mim, que me julgam. Vejo meu neto se entreter com Machado de Assis e faz ele muito bem. Vejo minha neta de 14 anos conversando ao telefone, dizendo à amiga que o teste de gravidez deu negativo ''graças a Deus''; isso por que ontem mesmo eu a ouvi jurando para a mãe ser virgem. Vejo meu genro enganando a trouxa da minha filha. Vejo nos olhos de minha filha que sente pena e dó de mim; porque agora não sou mais tão ''viva'' quanto era antes.
Para todos, só funcionam os meus olhos. Mas meu cérebro está aqui, mais ativo que nunca, fotografando as mais simples cenas cotidianas. Eu era escritora. Não dá pra acreditar? É, deve ser mesmo estranho ver um texto tão confuso como este e depois saber que foi uma escritora que o ''escreveu''. Não , não escrevi; é meu cérebro que registra. Está mais vivo que nunca. Já disse isso? Pare de ler isto; vá me julgar como os outros. Pense que sou sim uma velha ''esclerosada e psicótica'' que nunca foi jovem. Deixem meu cérebro em paz, pois assim, julgado como ''estragado'' ele pode funcionar sossegadamente.
É, eu disse a tempo a todos: ''É inútil lutar. Deixem-me morrer jovem.'' Mas estou velha e veja como acabei: esquecida em frente à uma tela de comerciais e programas capitalistas. Mas pelo menos me resta meu cérebro.
Ah, esqueça! Você, jovem, nunca entenderá o valor do cérebro na velhice.

H.Reis

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Momento Virginia


''O preço barato do papel é a razão por que as mulheres começaram por ter êxito na literatura antes de o alcançarem noutras profissões.''
(Virginia Woolf) postado por H.Reis

domingo, 8 de agosto de 2010

A máquina que leva e traz

A padaria parecia ter sido a máquina do tempo, pois o casal que saiu dali só poderia ter vindo dos anos 70. Ele, com sua barba e cabelos grandes, blusa negra, magro como a Etiópia, óculos rayban e coturnos. Ela, com uma tatuagem de ombreira, o cabelo preso revoltoso no alto da cabeça, camiseta cinza, calça de ginástica e também os mesmos óculos dele. Se isso é ou não um estilo dos anos 70 eu não sei, mas foi oque me pareceu quando vi os dois.
Passaram debaixo da minha janela sem o menor compromisso com nada, como se estivessem sozinhos num Paraíso muito merecidamente. Riam, davam as mãos e depois as soltavam, como num gesto de esquecimento do outro. Deviam ser namorados, pois a harmonia que os atría remetia isso. Eu, que estava na janela, á toa, só a observar os transeuntes cinzas , olhei-os com certa ternura por passarem ali e deixarem tanta doçura e anos 70 na minha rua e nos meus olhos. Eles se foram do mesmo jeito que vieram, com a falta de compromisso e o esquecimento. E eu imaginei que nunca mais os veria por ali, pois seria muita concidência, não? Mas não foi isso que aconteceu, eles foram e meia hora depois (sim, eu ainda estava na janela) voltaram. Passaram pela rua como se nunca tivessem pisado ali, o tom de novidade era claro nas risadas e olhares. Seguiram o caminho, foram além da padaria e ali devia ser o lugar onde eles retornariam para a década de qual tinham vindo. Tenho certeza que foi ali, foi ali o lugar onde eles encontrariam o caminho de volta pra casa; os anos propícios para aquela doçura e liberdade não eram os meus anos, não era a minha geração. E eles se foram, foram ser felizes num lugar que não existe mais.

H.Reis

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O sono que engana

''My Lady d'Arbanville, why do you sleep so still?
I'll wake you tomorrow
and you will be my fill, yes, you will be my fill.

My Lady d'Arbanville why does it grieve me so?
But your heart seems so silent.
Why do you breathe so low, why do you breathe so low.''

Cat Stevens- Lady D'Arbanville

Eu fiz roçar meus lábios no rosto dela e perguntei mais uma vez porque ela dormia tão imóvel. Ela continuou do mesmo jeito. Fui à cozinha preparar um café para levar-lhe à cama. Fiz de tudo, do mais variado. Levei cuidadosamente na bandeja. Chamei o nome dela bem de leve, bem baixo e suave para que ela não acordasse assustada, pois isso estragaria tudo.
Ela nem fez menção de acordar. Coloquei a bandeja em alguma superfície e fui à cama pra tentar acordá-la novamente. Sua respiração era tão baixa.
- Porque você dorme tão imóvel, querida? Porque respira tão baixo, quase sem me deixar sentir que suga, com suas narinas, o mesmo ar que eu? Isso é maldade. Deveria deixar-me ver seus movimentos inconscientes quando dorme; sua respiração profunda como um suspiro que leva a a alma num instante. Repito : isso é maldade.
Ela respondeu-me. Sim, mas sem nenhuma palavra.
Estava morta, respondeu-me com a morte.

H.Reis

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Morte e Vida Amor

Estou aqui a
Padecer
Morrer,
Não ser,
Não fazer,
Desde que vi que,
Com outra,
Você foi
Viver,
Ser,
E fazer.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Ah, você

Ah, eu pensando...
Ah, eu olhando....
Ah, eu amando......
Ah, eu sentindo......
Ah, eu escrevendo......
Ah, eu voando.......
Ah, eu;
Que perigo!!!

H.Reis

domingo, 25 de julho de 2010

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Momento Delacroix


''O segredo para não ter tédio, pelo menos para mim, é ter ideias.''

Eugéne Delacroix postado por H.Reis

terça-feira, 20 de julho de 2010

Agora. Não depois.

Seja alegre e esteja satisfeito com o que tens todos os dias; e assim estarás sendo feliz.
Isso de ser feliz no futuro é desculpa dos frustrados.
É muito utópico também.

H.Reis

Comodismo

''Fale mal, mas fale.''
''Pense mal, mas pense.''
''Faça mal, mas faça.''
''Leia mal, mas leia.''
Gostas disso de fazer mal, mas fazer?
Eu ainda fico com a velha tese de que o que merece ser feito, merece ser bem feito.

H.Reis

sábado, 17 de julho de 2010

Criança é fogo

O fio dental e o mendigo

Eduardo tinha exatamente cinco anos quando comecei a ensiná-lo a usar o fio dental. Depois de qualquer refeição, lá estava eu pegando no pé do menino:
- Edu, já escovou os dentes? Não esquece do fio dental, tá?
Ele obedecia, como bom garoto que era, mas sei que não gostava da mínima tarefa. Por ele, não passava fio dental, não escovava os dentes e muito menos tomava banho; viveria só de brincar e comer (oque quisesse).
Depois de tanto ouvir eu mandá-lo passar o tal fio, ele já fazia isso sem eu pedir e se bobeasse ainda lembrava os mais velhos de fazê-lo.
- Papai, o senhor passou o fio dental?
E todos adorávamos aquelas cenas. Ríamos internamente.
Certo dia, fui fazer compras no mercadinho do Seu Jaci e levei o precoce junto. Voltando de lá, vimos um mendigo deitado ao sol num meio-fio. Passamos do lado do tal, e ele, bem gracista, abriu um sorriso enorme e debochado para nós. O homem era sujo e sua boca e dentes mais ainda. Eduardo, mesmo com nojo, retribuiu o sorriso. Chegando mais adiante de onde estava o mendigo, Eduardo olha para mim e pergunta:
- Mamãe, sabe aquele moço que riu pra gente lá atrás?
- Sei, meu bem. O que que tem?
-A senhora bem que podia ensinar ele a usar fio dental, hein?

H.Reis

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Momento Florbela


" O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais; há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesma compreendo, pois estou longe de ser uma pessoa; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que não se sente bem onde está, que tem saudade; sei lá de quê! "

(Florbela Espanca) postado por H.Reis

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Segundos passam...

Solte os cabelos;
chame o vento;
abra as mãos;
crie asas;
feche os olhos
e sinta.
A vida é agora.

H.Reis

Escrever sobre nada

Sentada à bancada da cozinha ela tomava um café quente, comia biscoitinhos variados da Casa do Alemão e lia aleatoriamente crônicas de Stanislaw Ponte Preta. A janela não se deu ao trabalho de cobrar entrada do vento que adentrava ali. E então ela pensou em fechar a janela e parar de sentir o vento das 7:00 da manhã. Desistiu da idéia. Resolveu deixar suas pernas quentes sentirem o fresco. Era um tipo de equilíbrio : a boca fria tomava o café quente, e as pernas quentes tomavam o vento frio.
Lia e ria. Tomava e engolia. Comia e sentia.
Pensava em tudo. Pensou em escrever sobre aquilo. Tudo era razão e motivo para ela escrever. A poesia estava em sua cabeça a todo momento. Nas coisas mais banais e também nas mais sérias e precisas.
Veio escrever sobre isso e agora ela colocará o ponto final e assinará esse texto.

H.Reis

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Frases Aleatórias

Porífero

Sou como uma esponja: absorvo tudo.
Amor,
Fraqueza,
Feiúra,
Beleza,
Drama,
Sabedoria.
Só não sejas falso a meu lado.
Absorverei de ti.

H.Reis

Teatro real

''Fingir é conhecer-se'' Fernando Pessoa
Quero me conhecer realmente, por inteiro.
Está decidido: Quero ser atriz!

H.Reis

sábado, 10 de julho de 2010

Newton e as frutas assassinas

A professora de História chegou na sala. Os alunos estavam inquietos e falantes, barulhentos.
Ela logo pediu silêncio e perguntou oque houvera.
-É que o professor de física acabou de sair daqui dizendo que Newton estava sentado debaixo de uma macieira e uma maçã caiu na cabeça dele. E que com isso ele descobriu a lei da gravidade; respondeu Ana.
-Tudo bem, gente. Mas me expliquem o motivo do falatório. Não entendi ainda a relação do que o professor disse com essa barulheira toda.
André se prontificou a explicar :
-É que, Dona Inês, não faz sentido esse tal de Newton ter descoberto uma coisa tão importante como a gravidade só porque uma maçã caiu na cabeça dele. Pelo amor de Deus, né?
- Então, meninos, ignoremos que aconteceu. Pode ser que seja somente uma historinha para ilustrar, entenderam? Abram o livro de História na página 154.
-Ah não.O Ari disse que aconteceu, então aconteceu; disse Romão só pra botar mais lenha na fogueira e perder mais tempo da aula de História naquela discussão.
-Eu acho que tinha que ter caído era uma jaca na cabeça desse à toa desse Newton. Cara chato. Fica descobrindo coisa difícil pra gente ter que decorar; disse Cassiano.
-Ah, por que não uma melancia bem gigante?
-Huun, eu acho muito mais legal legal mamona, pra espinhar o cara todo.
E agora a discussão sobre ter acontecido ou não o fato de cair uma maçã na cabeça do Físico não era mais interessante para aqueles alunos. Cada um queria dar uma idéia sobre oque devia ter caído da árvore e matado o pobre homem.
OBS: eles inventavam árvores que nem existiam, como a de melancia.
Dona Inês se desfez do seu plano de começar a ensinar nazismo naquele dia. Achou melhor falar que se caísse dois melões na cabeça de Newton, seria mais eficiente. Afinal, ela também odiava Física na sua época de escola.

H.Reis

terça-feira, 6 de julho de 2010

E o destino decide...

Eles haviam saído para jantar, se conhecerem melhor. Riram ,conversaram, tiraram sarro das manias do outro, enfim , se divertiram. Indentificaram-se de primeira. Era fácil sacar que dali viria algo mais sério.
Ela tinha carro, ele não. Ela, por educação ou também por outros interesses, não se sabe ainda, o ofereceu uma carona. Ele,por educação ou também por outros interesses,não se sabe ainda, aceitou.
Foram pela Avenida ouvindo música, cantando juntos, errando e rindo do que não entendiam o cantor cantar.
Chegando no portão da casa dele, ela parou o carro e sorriu. Ele, por sua vez, se sentiu obrigado a perguntar se ela queria entrar.
-E aí? Não quer entrar...tomar alguma coisa?
O silêncio pairou na atmosfera do carro quente.
Ele teve medo de ela o achar precipitado. Mas ele queria que ela entrasse. Queria tomar um vinho com ela; rir mais um pouco; dar um beijo íntimo, escondido. Não queria que ela pensasse que ele era um aproveitador; que se ela aceitasse entrar, ele pensaria mal dela. Nada disso.Ele queria amá-la sem compromisso. Com um quê de amor de carnaval. Mas queria conhecê-la por inteiro. Suas caras e trejeitos. Suas cores e fitas. Seus gostos mais íntimos. Queria começar a amá-la naquela noite, com aquela lua, naquele teto, naquele dia.
Ela, por sua vez, teve medo de responder. Se aceitasse,oque ele pensaria dela? Certamente que era uma mulher fácil demais, dessas que se encontra em qualquer esquina; daquelas que eles viram na Avenida pela qual haviam passado a alguns minutos. Mas ela queria entrar; tomar um vinho com ele; fazer ele rir mais um pouco; receber um beijo mais íntimo, nas entrelinhas. Não queria que ele pensasse que ela era qualquer uma. Nada disso. Ela queria ser amada sem compromisso. Com um quê de amor de natal. Queria se deixar ser conhecida por inteiro. Explicar suas cicatrizes e contar as histórias que imaginava quando criança. Queria ser amada por ele naquele dia, naquele teto, com aquela lua, naquela noite e queria também amá-lo.
O destino, que tem lugar cativo na vida dos amantes,também tinha oque pensar. Pensava que aqueles dois não tinham que se importar com o que um pensaria do outro se entrassem e tomassem alguma coisa. Deviam, com toda vontade e desejo que tinham, começar a se amar naquela noite. Aproveitar a juventude, o riso, a lua e a falta de compromisso.
Ela,depois de muito pensar e parar de se importar com a opinião dele, respondeu:
- Só um pouquinho, sim?
E ele,com um sorriso a responde:
-Como quiser...
E o destino,por sua vez, considera como ganha a batalha e murmura para si, já sabendo de tudo:
- ...

H.Reis

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Cacos de pétalas

Flávia estava sozinha em uma mesa de um restaurante qualquer, tomando um café preto. Lembrava da briga que havia tido com César dois dias antes. Depois da briga ela não tinha mais notícias dele, e nem queria ter. A briga havia sido feia, dolorida, com pedaços de vidros sentimentais.
Na cabeça dela tudo passava como um filme mal feito. Sua mente emergia nas lembranças mas seu rosto não expressava qualquer pensamento saliente. César, apartamento, traição, indiferença, lágrimas, tapas, unhas, chão, fogo, raiva.
De repente entra no tal restaurante qualquer, César acompanhado de uma mulher estranhamente bonita. Ele vê Flávia, olha obscura e detalhadamente pra ela, sem nenhuma reação esperada.
Ela, com toda sua certeza de mulher madura retribui o olhar, mas agora com uma pitada de indiferença aguda.
Ele se sentou na mesa da frente com a tal mulher estranha, mas bonita.
Flávia não aguentaria ver aquilo por muito tempo. Chamou o garçom, pediu a conta, esperou.
E aquilo parecia uma eternidade. César fazia questão de encher sua acompanhante de beijos exagerados, tudo para Flávia ver. E o pior é que ela via e se importava muito. A conta chegou, ela pagou de nariz empinado o que César geralmente pagava. Levantou-se esguia, olhou para o caminho e o obstáculo que a esperavam. Andou alguns passos até chegar perto da mesa onde os dois provocantes estavam sentados. Chegando lá, não perdeu o ritmo e continuou andando como se estivessem sentadas ali pessoas nunca vistas por ela.
Chegou à porta do recinto, abriu-a e pisou no meio fio.
Respirou fundo. Deixou para trás o amor e uma esperança dele. Deixou para trás dois anos e a entrega. Deixou para trás um café preto e uma paixão vermelha.
Esperou pela frente um futuro melhor, mais amável e menos traiçoeiro.Sem cacos de vidros e sim com pétalas no lugar deles.
"E amanhã tem sol."(C.F.A)

H.Reis

sábado, 3 de julho de 2010

Me descrevendo em imagens

Adorei a ideia da Lia, amiga da Tassiane Américo e resolvi fazer também. Isso é só um pouquinho de mim.

Quem sou:
" Tenho várias caras. Uma é quase bonita, outra é quase feia. Sou um o quê? Um quase tudo. "(C.L)


Oque me faz sorrir:


''Me dê a mão, vamos sair pra ver o sol...''(Z.Baleiro)


Oque me faz chorar:


Minha cor é:

Hobby:



Sonho:



Melhor lembrança:

Eu e minha irmã
no jardim da vó Lenita.
Música é:


O escritor :
''Botas...as botas apertadas são uma das maiores venturas da terra, porque, fazendo doer os pés, dão azo ao prazer de as descalçar.'' Machado de Assis

Um filme:


Esporte:


Pecado:


Lembranças fofas da infância:





H.Reis

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Recomeçar


''Não há amor perdido, nem se fingem milagres
Não reparto o destino que me expia em saudades...
E o grito ecoa profundo;
"Quero o meu mundo!"
O assalto recomeça, o espelho fascina
Sigo encoberto, o quebranto domina...
Mas a vida desalinha!
Sepulto a ruína, ressurjo em apreço,
E de novo, recomeço.

Só quem se
arrisca a ir longe demais
descobre o quão longe se pode ir. ''

T.S Eliot (postado por H.Reis)

Vazios

Ela fumava um Vogue na varanda enquanto ele dormia pesado no quarto anexo.
Ela pensava que o amava, não tinha total certeza. A noite que passaram juntos havia sido linda, romântica, mas ela ainda estava vazia. Não sabia do que aquele vazio se compunha. Afinal, vazios não são compostos de nada, são apenas vazios.
Ele acordou, ficou na cama ainda um pouco, relembrando a noite passada, tentando reviver aqueles momentos em pensamento. Havia sido tudo perfeito para ele.
Levantou-se, foi lá fora na varanda, deu um beijo no pescoço dela e perguntou se ela havia dormido bem.
-Não dormi. Fiquei aqui fora sentindo a brisa leve e fumando uns cigarros.
-A noite toda?
-Aham. Ela respondia com indiferença, como se quisesse estar em outro lugar conversando com outra pessoa.
Ele, percebendo a frieza dela, foi lá dentro pegar um cigarro no maço que estava em cima do criado mudo. Chegou lá e só tinha a caixa, vazia. Pensou: ''ela deve ter fumado todos''.
Ficou preocupado, pois sabia que a amada só fumava quando estava passando por algum problema ou ansiedade. Resolveu não dizer ou perguntar nada.
Ela continuava lá fora, debruçada na grade que a impedia de pular daquela varanda do nono andar. Olhava os arranha-céus.
As roupas que vestira na noite anterior estavam emboladas nas dele em cima do sofá vermelho.
Quando ela notou que ele havia ido tomar banho, pensou logo em fugir ; deixar tudo aquilo pra trás e ir viver sua liberdade ou sua prisão. Viver seu vazio sem a intromissão de ninguém.
Pegou suas roupas no sofá cor de sangue, trocou-se rápido. Resolveu que nunca mais o veria.
Quis levar uma lembrança dele, pelo menos algum detalhe, nem que fosse pequeno.
Pegou o cinzeiro que eles haviam comprado em Búzios, colocou dentro da bolsa e saiu, toda amarrotada, pela porta do quarto insano. Desceu o elevador, chegou na rua, olhou pra cima e viu ele, debruçado na grade que o impedia de pular daquela varanda do nono andar. Olhava os arranha-céus. Ela voltou seus olhos para o mesmo ponto. Olhavam os arranha-céus. Não viram foi os arranha-corações. Pois esses tais ficam no vazio. No vazio de cada um. Naqueles vazios, que não são compostos de nada, são só vazios.

H.Reis

terça-feira, 22 de junho de 2010

''Quem são os animais?''

Esse texto baseia-se em um fato verídico.


Tínhamos aula de Literatura depois do intervalo. Estávamos estudando romantismo e pelo contexto da matéria, a professora resolveu passar um filme pra turma: ‘’Moulin Rouge’’. Acho que a sala toda já havia assistido antes, menos eu. Mas já que o trimestre estava no fim e não tinha mais matéria pra dar, ver o filme seria um jeito descontraído de ilustrá-la. A professora,uma das minhas preferidas e mais queridas, era linda, delicada, um doce de pessoa. Não sei se o fato de ela lecionar a matéria que eu mais gosto influenciava no meu carinho e admiração por ela. Conversávamos muito, ela sempre sorridente, tinha assunto pra tudo, era bastante culta.

Uma vez me contou que tinha um cachorro, Luan, de 10 anos. Disse que que era como um filho pra ela. Eu achava uma gracinha a relação dos dois. Ela tinha Orkut, no álbum, era provável ter mais fotos do tal cãozinho que da própria Andréa. A chamamos de Prette, é o sobrenome dela e além disso, temos outra professora Andréa , de Geografia.

Mas voltando ao dia do filme:Prette foi à nossa sala e chamou a turma para a sala de vídeo,o filme estava na última parte.Eu havia percebido que ela estava triste,abatida,sem sorrir,coisa habitual de ela fazer quando chega em sala.Comentei com a Jéssica a tristeza da professora e ela disse:

-É,também reparei.Ela deve ter brigado lá na coordenação. Ah, duvidei muito.Prette não era de brigar ou fazer confusão.Era de uma ‘’finesse’’ incrível.Nunca a vi elevar o tom de voz e ela me dá aula há um ano e meio.Quando a turma tá conversando,ela pára e diz:

- Pessoal,vamo lá.Só um minutinho aqui.Como se prestar atenção na aula fosse um favor que agente fizesse pra ela.

Então o filme rolava.Eu ,de 10 em 10 minutos olhava pra ela,que não mudava a fisionomia triste e angustiada.Eu já tava ficando preocupada.Ela fingia prestar atenção no filme,já visto umas 8 vezes por ela.Quando o filme acabou,ela foi levar agente pra sala.Eu fui andando do lado dela,não perguntei nada,só fiz algum comentário sobre o filme.Se ela quizesse me contar o motivo do abatimento,seria por ela mesma,eu não a pressionaria.No início do corredor ela diz:

-Ô,Helena,não te contei oque aconteceu.

-Oque,fessora?

-O Luan morreu ontem!

Minha cabeça rodou. O ''filho'' da fessora havia morrido ( pra que essas aspas? afinal, pra ela e o marido, ele era realmente um filho. Nutriam um amor sincero pelo animal.). Eu fiz aquela cara de espanto de sempre e disse:

-Aahhh! Fessora!! Bem que eu percebi que cê tá bem tristinha hoje. Que dó!

E ela, com aquele olhar inconsolável, disse:

-Pois é, lembra que no ano passado ele fez uma cirurgia na bexiga? Então, a infecção voltou e ele não resistiu.

Nisso agente já tava em frente á minha sala. Eu não sabia oque falar. Os olhos dela cheios d’água. Os meus já tinham enchido e transbordado ( sou sensível demais, chorona demais.).

-Que dó, fessora!

Dei um abraço de leve nela. Juro que por um momento tive medo de abraçá-la forte e ela acabar quebrando, pois estava tão frágil e sensível que isso não seria difícil.

-E como cê tá, fessora?

-Ah, eu tô arrasada. E ele era meu amigão, meu companheiro. Tinha 11 anos.

Acho que em vez de ‘’amigão’’ ela queria falar filho, mas por algum motivo não disse. Ela tinha que dar aula no 3ºano e o sinal já havia batido; desceu as escadas e eu no corrimão vendo ela descer e dizendo pra ela não ficar daquele jeito. Contei pra Jéssica oque tinha realmente acontecido. Nada de brigas ou discussões na coordenação. Era a morte do amado cachorro. Perda de um ente querido. Queridíssimo. Enquanto eu contava, minhas lágrimas brotavam involuntariamente. Jess olhava:

-Quê isso, Helena? E dava uma risadinha discreta.

Eu entendia, pois não é comum ver uma amiga sua chorando porque o cachorro da professora morreu. Mas eu chorava também por ver a tristeza da Prette; ela estava sofrendo e eu nada podia fazer para ajudar ou amenizar a dor dela. Prette nunca mais seria a mesma. Seus sorrisos literários das aulas teriam, nem que de leve, um tom de melancolia, dor, e mais: saudade. Ninguém substituiria Luan. Ela nunca mais veria os olhos doces daquele animalzinho.Uma parte dela se esvaziara.

OBS:O título é de uma crônica do Ruy Castro,da qual Andréa gosta muito.Uma ''homenagem''( com aspas,pois,quem sou eu pra fazer homenagem a Ruy Castro?)

H.Reis

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Fundo do poço

Juana estava de saco cheio de tudo.Sua mãe nunca a entendia,nunca a apoiava nem se preocupava com ela.O pai vivia bêbado pelas ruas da cidade maldita.A irmã se prostituía nos becos e suas notas na faculdade iam de mal a pior.Suas amigas se afastaram de uma hora pra outra.
Conclusão:estava totalmente sozinha.
Resolveu pegar a bolsa e sair.Tentar se livrar daquele mundo insano,incompreensível e incompreendido por ela.
Já estava tarde de uma noite de quinta feira.Havia chuvido, até as poças d'água formadas pareciam ter alguma aversão a Juana.
Passavam pessoas alheias na rua.Juana desejava ser alguma delas e não passar por nenhum problema pelo qual estava passando agora.Mas não pensava na possibilidade de aquelas pessoas também terem problemas como os dela,ou até piores.
Andava sem sentido,sem rumo.Até que parou no viaduto.Lá embaixo passavam carros,caminhões,bicicletas,motos e até cachorros mendigos que podiam ser atropelados a qualquer momento.
Quis se atirar.Quis por um momento,bem longo,acabar com aquela palhaçada que estava sua vida,sua solidão,sua alma de menina que foi obrigada a virar mulher,à crescer rápido.
Pensou bem.Chorou mais ainda.Despediu-se por pensamento de sua mãe incompreensível,de seu pai alcoólatra, de sua irmã perdida,de suas amigas sumidas.
Tomara que recebessem a mensagem por telepatia.Era a última vez que se ''comunicava '' com aquela gente que fazia parte de sua vida.
Se jogou do viaduto.
Acharam seu corpo em qualquer parte do asfalto,sua bolsa,sua morte.
Pela manhã, no jornal, deram a notícia da morte da ''menina jovem ,de 20 anos,que cursava jornalismo na Universidade Federal.Tinha um futuro promissor'',foi assim que a caracterizaram para o país.
Mas o problema é que não havia juventude,graduação ou Universidade que fizesse com que a tristeza de Juana tivesse um fim mais razoável.
E se chega a uma conclusão: foi melhor morrer.
Pois de mais uma pessoa imersa na tristeza o mundo não está necessitado.

H.Reis

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Só aquilo


Hoje eu saí de casa com o objetivo de me sentir livre,leve e solta.Literalmente.Queria ver na minha sombra refletida no chão,meus cabelos voando por causa do vento que batia neles e quase os levava junto,na direção do dia.Olhei o céu, não totalmente azul, tinha nuvens espalhadas, aquela inconstância me agradava.Eu andava devagar,respirava devagar,tentando sentir cada molécula do ar que entrava pelo meu nariz.Quando saí na rua acho que até chamei a atençao,pois todo mundo estava com pressa,correndo,preocupado,moderno.E eu na minha calma,dentro do meu objetivo,passos leves,respiração profunda e cabelos ao vento, e eu não tinha também nenhum lenço ou documento.Depois de fechar de leve o portão,coisa não habitual,pois sempre o bato com força,dei de cara com uma senhora,que não devia ser tão velha,mas que na aparência era.Tinha olhos bem pequeninos e cerrados,como se quisesse se fechar totalmente pra esse nosso mundo maldoso que a fazia parecer mais velha.
Meu sorriso de Monalisa estava impresso no rosto,só uma bomba o poderia arrancar dali.
Fui andando,quer dizer,quase volitando por aí.
Chegando mais à frente avistei o velhinho simpático que queria me vender relógios em uma outra semana passada.Ela estava sentado,sem nenhum propósito numa cadeira qualquer da sorveteria.O cumprimentei,ele pegou na minha mão.Mas que mãozinha mais quentinha tinha senhor Lorenzo!Minhas mãos ,que estavam geladas,devido ao frio que fazia,agradeceram àquelas mãozinhas macias e quentes do velho senhor.E foi um cumprimento demorado.Parecia que ,com aquele aperto de mãos,ele queria pegar um pouco da minha juventude ou então me passar o mínimo que fosse de sua sabedoria.
Eu havia saído de casa um pouco mais cedo,exatamente para poder cumprir o objetivo. Livre.Leve.Solta.Senhor Lorenzo me pegou de papo:
-Quando vai comprar o relógio, menina?
Eu adoro quando as pessoas me chama de ''menina'', me sinto ainda criança.
-Pode deixar,quando meu pai me der meu próximo dinheiro,eu vou guardar só pra comprar aquele relógio!
-Ah tah.
Não me lembro em que contexto,surgiu o assunto música(ele fazia esse assunto surgir de propósito para contar suas vantagens).
-Eu ganhava dinheiro,menina! Comprei até uma casa em Montes Claros.
-Annh,mas agora arte não dá dinheiro não, seu Lorenzo.
-Ah,mas naquela época dava.Eu que trabalhei com Orlando Silva,( e ele falava outros tantos nomes que eu nunca tinha ouvido) e tocava bateria e sax!
Eu ouvia aquilo com a máxima atenção possível,mesmo que aquilo não fosse verdade,eu queria que ele se deliciasse naquelas memórias e que houvesse alguém que desse importância e acreditasse.Aquele alguém era eu.
Me toquei que tinha horário para chegar no colégio.Me despedi com muito custo de seu Lorenzo,pois ele sempre puxava outro assunto e eu não o cortava de forma alguma.
Virei a esquina e andei rápido.Percebi que o velho senhor tinha me atrapalhado no objetivo,eu agora tinha que correr,tinha que pensar no relógio,tinha que respirar rápido e andar pesado.
Lá na frente,já com pressa e medo de perder a aula,vinha uma moça com uns celulares na mão,divertindo-se com uma amiga ao lado.
Perguntei as horas.
-3 e 50 e ... 4 horas!
-Obrigada ,moça.
Mas que droga,ela não podia nem me aliviar um pouquinho?Podia muito bem dizer : São 3 e 58,59.Mas não,disse 4 horas,só pra me apavorar mais e eu ter que correr também mais.
Acho que as pessoas deveriam ser mais compreensivas.
Cheguei na sala de aula,a professora já tinha começado a aula de química.
Caí na realidade.
Presa.Pressa.Dependência.Frio.
Não tinha mais mãos quentes,macias e musicais de seu Lorenzo ou o olhar pequeno da senhora aparentemente velha.
Tinha horários a cumprir,tabelas para decorar e provas a fazer.
E mais nada de leveza.
Mais nada de liberdade.
Era só aquilo.
Decepção.

H.Reis